CHEIRA-ME (cor) verde.
É O AROMA PREFERIDO da tia Esperança que queima incenso de manhã à noite, com medo do que não vem.
LEMBRA-ME a cozinha.
O aroma preferido da tia Esperança é o incenso de chá verde.
De tarde a Francisca ia sempre ver a tia, de cabelo grisalho no seu rabo de cavalo até à cintura, e eu ia também, meio por companhia, meio por impulso de perceber o porquê eu de querer voltar.
A tia Esperança lavava a roupa com limão e vinagre e estendia-a no quintal da frente. Não era preciso passar o portão para que o cheiro doce das tulipas se misturasse com o amargo dos ingredientes, cheirava a campo desabitado por mais amarelo e vermelho que existisse, mas não era solidão, era espaço de receber lavado.
A Francisca anunciava sempre a entrada ainda do passeio e quando passávamos o portão já estava a tia Esperança à porta de sorriso aberto.
Um beijinho na testa e um abraço com cheiro a chá verde. Nunca vi um bule lá em casa, era sempre leite e tostas com mel que tinha para servir. E o leite a mim, sabia-me a chá.
Um dia trouxe umas roupas que tinha feito para dar à Francisca. Experimentámos as duas, cores garridas como o batom vermelho que levávamos marcado na testa, de tal maneira que no dia seguinte jurava que ainda cheirava a maquilhagem barata.
O que me lembro da tia Esperança, da tia que não era minha, não era da cor dos olhos, mas do cabelo com cheiro a incenso e chá verde que nunca bebi.