Revelação

Alberto era o quarto filho e atribuía aos 21 e 19 anos de diferença, a falta de ligação com os dois irmãos mais velhos, Joaquim e António.
Tinha passado a infância e a adolescência a tentar incluir-se nessa dupla, mas sem sucesso.

Não conhecia o pai, a não ser por fotografias, Joaquim dizia que o pai tinha morrido de desgosto por Alberto ter nascido. A mãe e a Rosário, mais velha que Alberto 17 anos, atiravam-se a Joaquim sempre que esta frase era proferida. Portanto não se tocava no assunto. Bem ou mal o pai não voltava!

Entre a dupla de irmãos e a dupla feminina existia uma força magnética, não se conseguiam separar apesar da brutidão de alguns encontros.
Agora era um pouco mais calmo, a idade colocou-lhes freio no temperamento e, com cada um a viver na sua casa, encontravam-se menos vezes, o que também ajudava.

Encontravam-se todos, os cinco, em dias festivos ou fúnebre e assim foi a 19 de Abril, com a morte da mãe. Houve lágrimas de tristeza, gritos de aflição e abraços fraternais, até que Alberto entra num mantra que não tinha mãe, “não tenho mãe, aiaiai a minha mãe, agora acabou, não tenho mãe”. O Joaquim enlouqueceu e num repente gritou-lhe aos ouvidos “TENS, TENS, olha ali a Rosário!”.

As caras rosadas de choro empalideceram, os corações que batiam pesados e solenes aceleraram como tractores e da boca da Rosário sai uma enxurrada de palavrões na direcção de Joaquim, que tinha o braço de António entrelaçado no seu, como que a prevenir uma queda eminente.

Na cabeça de Alberto tudo fazia sentido, a dita morte de desgosto do pai, a mudança para a cidade, o desapego deles e o apego delas. Olhou para a Rosário e, pela primeira vez, conseguia entender o amor que lhe sentia. Aos 35 anos encontrou todas as explicações que lhe atazanavam a cabeça até ali, como a morte pode ser reveladora, não perdera a mãe, ganhara-a.